terça-feira, 17 de julho de 2012

A tabaroa vestida de chita e calçada de tamancos: Aracaju, rumo à modernidade.

Rose Almeida [1]

Venha amiga.
Venha ver a minha cidade.
Não serei, certamente, um guia como Gilberto Freyre na cidade do Recife, nem
Como Jorge Amado na sua cidade de Salvador.
Não há, também, na cidade de Aracaju, minha terra, terra nossa, terra de luz e de
Tranquilidade, riqueza de coisas velhas, cheirando a mistério, recendendo a tradição.
Eis, aqui, a Aracaju do passado, doce e amável. (...)
(Mário Cabral, 2002)

O século XIX marcou o cotidiano da sociedade sergipana, especialmente o dos moradores da recém-inaugurada capital. Em 1855 é transferida a capital do Estado de Sergipe, de São Cristóvão para Aracaju, idealizada pelo então presidente da Província Inácio Joaquim Barbosa e traçada pelo engenheiro Sebastião Pirro. A nova capital surgiu sob a égide de cidade planejada, projetada de forma simétrica a “menina dos olhos de Inácio Barbosa”, enfrentou diversos entraves e desafios em busca da sonhada modernidade.
A modernidade no início do século XIX “foi por excelência, um momento de transformações em múltipla escala”[2].  Destarte, Aracaju não fugiu a regra, a população aumentou e a cidade cresceu, sinalizando assim, a chegada do progresso. Intitulada pelo jurista Gumersindo de Araújo Bessa, como a tabaroa vestida de chita e calçada de tamancos, foi nas primeiras décadas do século XX que Aracaju despontou como sede politico-administrava e principal centro urbanístico e industrial do Estado, as residências aos poucos foram cedendo espaço a um comércio acanhado. Com destaque também para a chegada do bonde de tração animal (a partir de 1901), a água encanada  e o cinema que começou em 1909. Seguidos pelos os serviços de esgotos, aterros e drenagens de lagoas e pântanos, medidas de higienização e calçamento.
Segundo a historiadora Maria Nele dos Santos “embora depois de 1922, os habitantes se imaginassem respirando os ares da ‘modernidade’, havia muito a fazer-se para o saneamento e profilaxia de Aracaju”, tornando-se necessária a adoção de medidas que proporcionasse uma nova fisionomia à cidade, dando-lhes um ar habitável e higiênico, estabelecendo um novo conceito para seu embelezamento, destruindo e desapropriando casas de palha e taipa, ruas irregulares cedeu lugar a novas ruas e avenidas planejadas, deslocando a população menos favorecida para lugares distantes do centro comercial, dificultando o acesso aos seus locais de trabalhos, tendo em vista que as fábricas e as lojas comerciais localizavam-se nesse perímetro, inúmeros problemas inerentes ao crescimento da cidade destoavam-se da modernidade almejada por seus governantes.
É sobremodo importante assinalar que enquanto a cidade de Aracaju se transformava em cidade modelo, São Cristóvão, Laranjeiras e outras cidades do Vale da Cotinguiba entravam em decadência. As novas regras de mercado impuseram aos produtores de açúcar e algodão a diminuição da fabricação desses produtos, prejudicando assim seu consequente retorno financeiro. Sobrepõe-se ainda analisar o suntuoso crescimento da indústria têxtil em Aracaju como fonte precípua de riqueza ao Estado, contribuindo para a migração do campo para a cidade, favorecendo o crescimento da população aracajuana.
A cidade de Aracaju, embasada por seu recente código de postura, forjava uma estrutura urbana, utilizando-se do aterramento de charcos, apicuns, pântanos e desvio de rios em sua edificação, expandindo-se em inúmeras direções, em especial para a região oeste seguindo o eixo rodoviário, obrigando a população pobre a instalar-se em terrenos mais baratos quase sempre desprovidos de infraestrutura urbana, formando núcleos periféricos sem organização e com adensamento populacional, obedecendo porém a nova forma de construção das cidades que tiveram modelos nas cidades-capitais do século XIX.
O desenvolvimento de Aracaju se dá efetivamente a partir de meados da década de 30 e inicio dos anos 40. Neste período a cidade passa pela “necessidade de redefinição de sua função econômica, uma vez que a atividade portuária entra em franca decadência”[3] motivo principal de sua fundação. Tornando-se necessário a partir de então a implementação da construção de importantes edifícios na capital, hoje considerados de interesse histórico-cultural pelo Plano Diretor de Aracaju, como: O Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe, a Biblioteca Pública (atual Arquivo Público do Estado), diversas igrejas,  a Associação Atlética de Aracaju, o Edifício dos Correios e Telégrafos e o Palácio Serigi.
Segundo MACHADO (1989) “Aracaju só ganha fisionomia de cidade a partir das primeiras décadas do século atual (XX), quando começa a firmar-se na vida politica e administrativa do estado e economicamente, quando os primeiros estabelecimentos industriais, surgidos no final do século passado (XIX), provocam o inicio da formação de bairros, agora com características mais populares e fora do quadrado de Pirro”.
Importa salientar que a população aracajuana começa a nascer como agente social e integrante de um projeto inovador a partir de muitos percalços em busca de sua identidade. Com seu vestido de chita e seus tamancos, a planejada Aracaju, dançou vários ritmos, resistiu a muitas façanhas e ditou os rumos de seu progresso.


Referência Bibliográfica:


CABRAL, Mário. Roteiro de Aracaju. 3. ed. Aracaju: Banese, 2002.

LOUREIRO, Kátia Afonso S. A Trajetória urbana de Aracaju em tempos de interferir. Aracaju: Instituto de Economia e Pesquisa – INEP, 1983.

MACHADO, Ewerton Vieira. Aracaju: Paisagem e feitiches. Abordagem acerca do processo urbano recente. Dissertação de Mestrado em Geografia. Universidade Federal de Santa Catarima. 1989
PORTO, Fernando de Figueiredo. Alguns nomes antigos do Aracaju. Aracaju: Gráfica Editora J. Andrade Ltda., 2003.

PESAVENTO, S. J. Exposições universais: espetáculos da modernidade no século XIX. São Paulo: Hucitec, 1997.

RIBEIRO, Neuza Maria Góis. Transformações do espaço urbano: o caso de Aracaju. Recife:FUNDAJ, Editora Massangana, 1989.

SANTOS, Maria Nele.  Aracaju na contramão da “Belle Époque”. In: Revista de Aracaju, n. 9, ano LIX, 2002.




[1] Acadêmica do curso de História na Universidade Federal de Sergipe, Bolsista do PIBID, sob a orientação da Professora Célia Cadorso Costa.
[2] PESAVENTO, S. J. Exposições universais: espetáculos da modernidade no século XIX. São Paulo: Hucitec, 1997 p. 29.
[3] (LOUREIRO,1983, p.59)